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Estatuto de facção Povo de Israel estabelece regras de comportamento para presos no Rio
2024-10-23 HaiPress
A facção Povo de Israel tem um 'estatuto',com normas para os presos seguirem — Foto: Editoria de Arte
Com uma legião estimada em 18 mil membros,a facção Povo de Israel (PVI) nasceu com o objetivo de proteger os presos “neutros” da atuação de rivais no sistema penitenciário fluminense. Para integrar aqueles que não eram aceitos por outras organizações criminosas,o grupo estabeleceu um estatuto de conduta.
Construtora,lotérica,atacadista de frutas: veja as empresas usadas pela facção Povo de Israel para lavar o dinheiro do crimeOrganização criminosa que age em presídios: facção Povo de Israel é alvo de operação das polícias Civil e Penal
O texto,escrito em papel de caderno à caneta e incluído na investigação da Seap,diz que,a partir da entrada na prisão,o que foi feito lá fora não será considerado. Proíbe usar a palavra “estuprador” (um crime que é condenado por outras facções). E determina que uma dívida deve ser vista como uma responsabilidade.
A questão religiosa inspira outras regras. O mandamento cristão “Não cobiçarás a mulher do teu próximo”,por exemplo,ganha uma versão na linguagem do crime: é trazido por “Alandelon é inaceitável no nosso povo”. No caso,a grafia torta para o nome do galã francês Alain Delon define alguém que fica com a namorada de um amigo.
O primeiro artigo do "estatuto do Povo de Israel" diz que,do portão para dentro do presídio,"zera tudo" — Foto: Reprodução
Os artigos também tratam do comportamento na cadeia. Não é permitido nenhum tipo de “porcaria” no momento das refeições. “Essa hora é sagrada”,explica o estatuto. Também há uma ordem para “não levantar bandeira de facção” e “não guardar mágoa ou munição do amigo”,regra que busca evitar conflitos entre os membros do grupo .
Apesar de receber detentos rejeitados por outras facções,como Comando Vermelho (CV),Terceiro Comando Puro (TCP) e Amigos dos Amigos (ADA) — eventualmente por terem cometido crimes inaceitáveis nesses grupos —,o PVI também tem seus próprios limites. A investigação da Seap obteve um áudio em que uma liderança da facção proibiu o golpe de estelionato no Dia das Crianças de 2022.
Movimentação de cerca de R$ 67 milhões: criminosos dividem os lucros entre 'empresários','ladrões' e 'laranjas'
O áudio que teria circulado em aparelhos dos presídios fluminense dizia: “As 13 aldeias de Israel,hoje meia-noite para roubo,banco,para tudo,as 13 cadeias,pode transmitir essa mensagem nas 13 cadeias. Vilão mandou parar tudo,para quem pode e obedece quem tem juízo”.
No estatuto,o artigo 7º diz para o preso "não fazer dívida que não possa pagar" — Foto: Reprodução
Outro áudio dizia: “Alô,quartel da tropa de Israel,zero horas para tudo! Ordem do patrão,se pagar para ver já sabe,hein. Salve as criancinhas,um feliz Dia das Crianças para todo mundo,forte abraço!”.
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De acordo com as investigações,a ordem teria sido repassada por Marcelo Oliveira da Anunciação,o Tomate. Preso no Instituto Penal Benjamin de Moraes Filho,Tomate teria um cargo de prestígio elevado na estrutura hierárquica do PVI. Condenado a 48 anos de prisão,tem 12 anotações criminais por crimes de roubo,homicídio,furto,estelionato e estupro —do total da pena,já cumpriu o equivalente a 37 anos.
Presos 'neutros'
A facção Povo de Israel (PVI) nasceu com o objetivo de proteger os presos "neutros" da atuação de facções no sistema penitenciário fluminense. No início dos anos 2000,a organização pleiteava a criação de uma unidade prisional de alocação exclusiva para separar o grupo de membros do Comando Vermelho e do Terceiro Comando. Com o tempo,o PVI aperfeiçoou sua atuação em golpes de falso sequestro e usou o lucro para cooptar novos integrantes. Além de convocar bandidos expulsos de outras facções criminosas,eles também oferecem "acolhimento" nos presídios para atrair novos aliados. Na manhã desta terça-feira,uma operação da Polícia Civil e da polícia penal tem como alvo a facção.
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Estabelecida nas chamadas unidades "neutras",sem domínio de facção com influência fora do presídio,a PVI tem uma "caixinha" conjunta,para onde vai parte do dinheiro recebido em golpes de extorsão. Com os recursos,são comprados itens de consumo pessoal para o preso que acabou de entrar em uma unidade,que vão desde itens pessoais de limpeza até colchões. Após estabelecer um vínculo de confiança e formar aliança,os presos são cooptados para trabalhar como "ladrões",realizando as abordagens criminosas por telefones cedidos pela própria facção. Pela empreitada,o grupo paga 30% do valor arrecadado.
No "estatuto do Povo de Israel",há regras de conduta,como "não agredir verbalmente,nem fisicamente" — Foto: Reprodução
Investigações da Polícia Civil mostram que esse grupo movimentou cerca de R$ 67 milhões — em dois anos — com golpes por telefone. As operações financeiras foram detalhadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em um inquérito da Delegacia Antissequestro (DAS),aberto após uma pessoa do Rio Grande do Sul ter sido vítima da organização criminosa. O relatório foi usado pelo Ministério Público do Rio para pedir o bloqueio de bens de 84 pessoas e cinco empresas suspeitas de lavar o dinheiro para o Povo de Israel,que usaria firmas para ocultar recursos ilícitos. Entre elas,estão uma construtora,um atacadista,uma loja de bolsas e outros acessórios,uma joalheria e até uma lotérica em Apiacá,no Espírito Santo.
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Além do falso sequestro,o grupo também faz ameaças a comerciantes e moradores em áreas dominadas por outras facções. As vítimas são forçadas a transferir dinheiro para contas de terceiros,que repassam os valores conforme ordens da chefia do grupo. Segundo a polícia,o lucro dos golpes é dividido em quatro partes: 30% para o “empresário”,responsável pelo celular; 30% para o “ladrão”,executor do golpe; 30% para o “laranja”,que recebe o dinheiro; e o restante vai para o caixa comum do PVI.