A La Niña virou 'La Nada'? Chuva está de volta após a seca histórica, mas de maneira desigual; entenda
2024-11-22 HaiPress
Tempo nublado em São Paulo — Foto: Maria Isabel Oliveira
RESUMO
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"Retorno das Chuvas Desiguais no Brasil: La Niña Atrasada e Impactos na Amazônia e Pantanal"
Chuvas desiguais marcam retorno após seca histórica no Brasil. La Niña atrasada é apelidada de La Nada. Umidade do Atlântico substitui a Amazônia. Pantanal e Amazônia sofrem com a falta de chuvas. Probabilidade de La Niña diminui devido ao aquecimento dos oceanos.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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O fim de semana será de chuva nas regiões mais populosas do Brasil,e isso é uma boa notícia,após o país ter passado este ano pela mais ampla seca dos últimos 100 anos. A chuva é bem-vinda para recompor reservatórios de usinas hidrelétricas,para a agricultura e para a natureza.
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Porém,uma parcela considerável da Amazônia continua a sofrer com a estiagem. E a esperada La Niña,que poderia reduzir a seca no Norte do país,de tão atrasada,já está sendo chamada de La Nada por meteorologistas. Se ainda vier,será no verão e terá pouco impacto,afirmam.
Novembro está mais chuvoso do que a média histórica,mas isso não é generalizado,diz o coordenador de Operação do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden),o meteorologista Marcelo Seluchi. A região com os maiores acumulados de chuva ocupa uma faixa do Centro-Oeste ao Sudeste,o que é característico da estação chuvosa.
O tempo no Brasil a partir de novembro,segundo o Cemaden — Foto: Editoria de arte
Choveu acima da média no estados do Rio e São Paulo,em Minas Gerais e em Goiás. Essa região alimenta bacias como Araguaia-Tocantins e as cabeceiras do Rio Paraná.
Até o fim do mês,a chuva deve prosseguir no Centro-Oeste,mas enfraquecer na Região Sudeste. Os modelos preveem que se deslocará um pouco mais para o Norte de Minas Gerais e para o Nordeste.
No Sudeste,onde a maior parte da umidade tem se concentrado até agora,as chuvas também têm aliviado o calor. Na primavera e no verão,são um regulador fundamental de temperatura. Dias encobertos ou com pancadas no fim da tarde,são mais amenos. Até o fim do mês,porém,o calor deve aumentar.
Mas o clima dentro da normalidade acaba aí. O que causa surpresa,observa Seluchi,não é a época da chegada das chuvas,que normalmente costumam retornar na primavera. E sim a forma abrupta como o clima virou a chave de muito seco para substancialmente chuvoso,e,sobretudo,a origem da umidade que alimenta as chuvas.
— Nessa faixa do território houve um início abrupto da estação das chuvas,por volta de 10 de outubro. Temos mais de um mês de comportamento de estação chuvosa. A atmosfera já trabalha em modo verão — destaca Seluchi.
Normalmente,a umidade vem da Amazônia. Mas não é o caso este ano. A Amazônia passou este ano por uma situação de seca extrema,com baixíssimo nível de rios,e em parte da região as chuvas estão atrasadas.
Umidade do atlântico
O atraso na estação chuvosa amazônica levava a crer que isso também adiaria as chuvas no Sudeste e no Centro-Oeste. Mas a umidade veio diretamente do Oceano Atlântico,salienta Marcelo Seluchi.
O Atlântico segue mais quente do que o normal bem em frente ao Brasil e se tornou uma fonte importante de umidade. Mais água evapora e é lançada na atmosfera,como vapor.
— É muito interessante e,de certa forma,surpreendente. A umidade se instalou. Após a passagem de uma frente fria,começou a chover. E,quando a chuva começa,se forma uma espécie de círculo virtuoso,porque ao chover,melhora a umidade. Chove porque está úmido e está úmido porque chove — explica o meteorologista.
O Sul do Brasil,tem tido chuvas abaixo da média histórica para o período,após o dilúvio do primeiro semestre. Também não tem chovido o suficiente no Pantanal,que teve uma das piores secas da história. E tampouco a situação melhorou na Amazônia.
— A Amazônia continua muito abaixo da média histórica. Tem chovido,mas muito aquém do que deveria. As chuvas estão superatrasadas,em especial no Acre,no Amazonas,no noroeste do Mato Grosso e em Roraima — frisa Seluchi.
Por mais paradoxal que pareça,o Atlântico também é o culpado pela seca na Amazônia. Ele prossegue muito mais quente do o normal na América Central e isso tem concentrado as chuvas lá e favorecido furacões.
— A umidade que sobra na América Central falta sobre o Norte do Brasil — diz Seluchi.
O que poderia trazer alívio para a Amazônia seria a La Niña,esperada desde meados do ano. Mas seus sinais são cada vez mais fracos e distantes. Um atraso tão grande que mundo afora meteorologistas já a apelidaram de La Nada.
O último boletim da Agência de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos (Noaa,na sigla em inglês),emitido na segunda-feira,indica que a situação no Pacífico Equatorial — onde a La Niña e o El Niño se formam — é de absoluta neutralidade. A mesma coisa mostra a Universidade de Columbia,que também faz o monitoramento.
A maior possibilidade é que a La Niña decline de vez,diz o meteorologista americano Shane Brown. O fenômeno é caracterizado pelo esfriamento das águas nessa região do Pacífico. O El Niño é o oposto,com águas mais quentes. Ambos impactam o clima global.
No Brasil,o El Niño costuma trazer calor generalizado e chuvas intensas no Sul,como o ocorrido na primeira metade do ano. A La Niña,em geral,ameniza as temperaturas e pode trazer chuva para parte da Amazônia,embora seque o Sul.
Após o forte El Niño encerrado em julho,havia sinais de que uma La Niña poderia se formar em agosto. Mas mês a mês esses sinais foram se enfraquecendo.
Em outubro,diz Marcelo Seluchi,o Pacífico até chegou ao padrão que caracteriza o início de uma La Niña,com uma anomalia negativa de 0,5°C. Mas esse padrão precisaria se manter por cerca de três meses,e o Pacífico voltou a esquentar.
— Eu diria que essa La Niña praticamente não tem chance de vingar. Ela perdeu o bonde — diz Seluchi.
A Noaa diz que há 57% de chance de que uma La Niña finalmente se forme em dezembro ou janeiro. Para a Universidade de Columbia,a probabilidade não passa de 48%. E cairá à medida que 2025 avançar,chegando a 18% em setembro — o limite das previsões.
A única notícia boa é que a probabilidade de um El Niño é de 10% até junho de 2025,quase nula. Porém,a probabilidade aumenta para 25% em setembro.
O que está por trás do desaparecimento da La Niña antes mesmo de ter nascido parece ser o aquecimento generalizado dos oceanos.
— Num cenário de aquecimento generalizado dos oceanos,haver uma anomalia de esfriamento de pelo menos 0,5°C é cada vez mais difícil. O sistema atmosfera-oceano está tendo mais facilidade para criar El Niños e mais dificuldade para Las Niñas — explica Seluchi.